Por Rosângela Barcellos* Estamos vivendo um momento de grandes transformações que nos desafia a rever nossa forma de pensar, a forma como julgamos as situações pelas quais passamos, nossos paradigmas, as adversidades que enfrentamos e principalmente a forma como nos relacionamos, não somente com as pessoas, mas com todo o sistema no qual estamos inseridos. Daniel Goleman e Peter Senge, renomados autores no campo das emoções, da compreensão do sistema humano e do aprendizado sistêmico como um todo, destacam a importância de entender nós mesmos, o outro e o grande sistema do qual fazemos parte. Mas qual a conexão tem esse cenário com a prática da liderança? Na efetividade de uma liderança, é importante considerar que, para se ter sucesso na relação com seus liderados, é preciso saber como se relacionar consigo mesmo e com o outro, construindo, assim, uma relação madura para chegar a um propósito comum. Diga-se de passagem, este é um processo longe de não ser desafiador. Para atingir um nível de maturidade adequado, um líder precisa, primeiramente, conhecer a si mesmo, saber de que forma funciona seu padrão de comportamento, como age, qual impacto tem suas ações na relação com o outro, saber de seus pontos cegos, etc. Realmente, este não é um caminho simples de viver na íntegra e de forma coerente com a teoria, que, por vezes, proclamamos nos corredores e nas reuniões do ambiente organizacional, pois, somos humanos, e como tal, estamos habituados a agir rotineiramente, muitas vezes de uma maneira “cega”. Nem sempre nos damos conta que podemos estar funcionando improdutivamente, “presos” em um sistema que pode se revelar imune a uma mudança que precisamos fazer e que nos desafia na prática de uma liderança efetiva. Minha experiência com desenvolvimento de adultos há mais de duas décadas e, principalmente, nos últimos nove anos tem revelado que mudar é algo complexo, gerar transformação pode exigir mais do que uma simples mudança, exige querer, reconhecer que há a necessidade de mudar e sentir-se mobilizado. Muitas vezes, prometemos liderar mais, planejamos, traçamos metas, mas nem sempre elas saem do papel em sua plenitude, na íntegra. Mas o que realmente acontece conosco? Resistimos à mudança? Não queremos abrir mão da nossa zona de conforto? Ou, na verdade, pode estar revelando algo mais profundo, algo como um sistema que nós próprios criamos e que opera de uma forma imune, impedindo de promover a mudança que tanto queremos e precisamos fazer? Tive o privilégio de conhecer a fundo e in loco o sistema que foi batizado de “Imunidade à Mudança” com os professores da Harvard, Robert Kegan e Lisa Lahey, os mesmos que criaram o termo “Imunidade a Mudança” para explicar e revelar que criamos um poderoso sistema inconsciente que trabalha “contra”, impedindo de realizar nossos grandes objetivos de melhoria, com o único objetivo de nos proteger. Para entender melhor se está imune à liderança, ou seja, “preso” nesse sistema, basta identificar um aspecto próprio como gestor que te incomoda. Por exemplo: imagine que você é um grande gestor de uma equipe, mas, lá no fundo, não confia que as pessoas de sua equipe podem dar conta do recado como você; por não confiar, não delega; por não delegar, acaba pegando muitas coisas operacionais para você fazer, as tarefas se acumulam e você sente-se sobrecarregado; não prioriza o pensar estrategicamente e o ciclo se repete ano após ano, tornando-se um círculo vicioso. Se você se identificou, este é um forte indicador de que pode estar operando dentro de um sistema que o impede de ser um líder que delega e confia mais. Esse sistema tem como objetivo te proteger de alguma grande preocupação oculta caso torne-se esse líder que delega mais, que acredita que poderá acontecer algo ruim ou que pode perder algo que já conquistou, se fizer o contrário do que vem fazendo. Um passo importante é checar suas preocupações ocultas e se de fato procedem, ou seja, testar, experimentar ser um líder na prática mais flexível, que divide tarefas, delega e acompanha, ao checar por meio da experiência, verificar quais resultados obtém, qual impacto está causando nos resultados, na relação com seu liderado e, principalmente, consigo. Na medida em que você avança na prática, pode aumentar sua crença de que o exercício da liderança traz resultados interessantes em longo prazo e permite gerar satisfação naqueles que o rodeiam. Nesse contexto desafiador, a responsabilidade do líder para gerir pessoas, equipes e, principalmente, a ele mesmo ficou maior, tornando-se crucial saber quem somos como líderes, ampliando nossa própria lente para identificar o que realmente nos impede de manter o equilíbrio da gestão versus liderança no dia a dia organizacional e, quem saiba, libertar-se de um sistema que aprisiona nossa real capacidade desenvolvedora. *Experiência nacional e internacional como Coach de Executivos, Diretores, Gestores e Carreira. Única Professional Coach Certified pela International Coach Federation em Mato Grosso do Sul. Professora convidada pela Fundação Dom Cabral.